27 janeiro, 2010

Reforma Agrária

Reforma Agrária



A concentração da propriedade da terra está profundamente enraizada na formação histórica do país. Tais raízes remontam à natureza da colônia e das leis coloniais, as quais introduziram graves distorções na distribuição das terras e, a partir da segunda metade do século XIX, no funcionamento do mercado fundiário.
O problema agrário contemporâneo tem sua origem na natureza e forma assumida pelo processo de ocupação do território brasileiro desde seu descobrimento. Neste sentido assume o status do “pecado original”. O modelo básico de ocupação da terra foi o recorte da costa em 12 capitanias, doadas a famílias de nobres com plenos poderes sobre o território. Os donatários, que não dispunham de recursos suficientes para explorar seus domínios, mas tinham poder de dispor das terras, doaram grandes áreas — as sesmarias — a colonos, os quais se estabeleciam para explorar comercialmente a cultura do açúcar, cujo mercado encontrava-se em grande expansão na Europa. As pequenas explorações, admitidas pelos sesmeiros, ocupavam as franjas da grande propriedade, constituindo-se em fonte de mão de obra livre para trabalhar na lavoura de cana, em tarefas de supervisão e de produção de gêneros básicos para alimentar a mão de obra escrava.
À medida que se expandia a monocultura de cana, a pequena exploração movia-se em busca de novas terras dentro dos vastos domínios da grande fazenda. Consolidou-se, portanto, ainda no período colonial, não apenas a concentração fundiária mas também a relação latifúndio - minifúndio que marcaria tanto a estrutura fundiária como a dinâmica agrária brasileira. A presença do latifúndio, explorado de forma extensiva com base em um conjunto de relações de produção (da parceria ao pequeno arrendamento) que tinham como fundamento o controle da terra, marcou profundamente a formação e conformação da Nação. A riqueza gerada nas lavouras de cana e engenhos de açúcar, nas plantações de café, na exploração do ouro ou da borracha concentrava-se nas mãos de uma minoria, que reproduzia aqui os padrões de consumo e de vida da Europa, enquanto a maioria sobrevivia em condições precárias, sem ou com pouco acesso aos progressos produzidos a cada surto de desenvolvimento. A posse e propriedade da terra eram a fonte de poder político e econômico, e desde cedo a elite rural impediu o acesso às terras devolutas aos imigrantes e aos negros.Configurava-se a Nação desigual que ainda hoje caracteriza o Brasil.


À medida que o País caminha para estágios mais avançados do processo de industrialização através da substituição de importações, redefine-se o papel e a inserção da agricultura na economia nacional. Já não se trata apenas de manter “enclaves” exportadores, mas de suprir alimentos baratos para as cidades; fornecer matérias-primas para as agroindústrias nascentes e em expansão; gerar saldos positivos na balança comercial com o exterior a fim de possibilitar a importação dos insumos, das máquinas e dos equipamentos necessários à industrialização; transferir excedentes de capital para serem investidos na industrialização e fornecer excedentes de mão-de-obra para suprir os mercados urbanos de força de trabalho. A Questão Agrária ― como a agricultura responde aos desafios e exigências colocadas pela expansão do capitalismo ― emerge como central para definir o estilo de desenvolvimento do País. A quebra do latifúndio implicaria a possibilidade de alargar o mercado doméstico e de construir uma sociedade menos desigual, mas prevaleceu o pacto conservador ou modernização conservadora, que preservou a grande propriedade, excluiu os trabalhadores rurais e agricultores familiares das conquistas trabalhistas concedidas aos trabalhadores urbanos e ainda assegurou as condições para a reprodução da grande propriedade nas regiões de fronteira.

Texto adaptado de “Reflexões sobre Reforma Agrária e Questão Social no Brasil” de Antonio Buainain, professor de economia da Unicamp

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