31 dezembro, 2009

Feliz Ano Novo!!

Feliz ano novo!

FREI BETTO

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O ano será novo se, em nós e à nossa volta, superarmos o velho, aquilo que já não contribui para tornar a felicidade direito de todos
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POR QUE DESEJAR feliz ano novo se há tanta infelicidade à nossa volta? Será feliz o próximo ano para afegãos, iraquianos e para os soldados americanos sob ordens de um presidente que qualifica de "justas" guerras de ocupações genocidas? Serão felizes as crianças africanas reduzidas a esqueletos de olhos perplexos pela tortura da fome? Seremos todos felizes, conscientes dos fracassos de Copenhague, que salvam a lucratividade e comprometem a sustentabilidade?
O que é felicidade? Aristóteles assinalou: é o bem maior a que todos almejamos. E alertou meu confrade Tomás de Aquino: mesmo ao praticarmos o mal. De Hitler a madre Teresa de Calcutá, todos buscam, em tudo o que fazem, a própria felicidade.
A diferença reside na equação egoísmo/altruísmo. Hitler pensava em suas hediondas ambições de poder. Madre Teresa, na felicidade daqueles que Frantz Fanon denominou "condenados da Terra".
A felicidade, o bem mais ambicionado, não figura nas ofertas do mercado. Não se pode comprá-la, há que conquistá-la. A publicidade empenha-se em nos convencer de que ela resulta da soma dos prazeres. Para Roland Barthes, o prazer é "a grande aventura do desejo".
Estimulado pela propaganda, nosso desejo exila-se nos objetos de consumo. Vestir esta grife, possuir aquele carro, morar neste condomínio de luxo, reza a publicidade, nos fará felizes.
Desejar feliz ano novo é esperar que o outro seja feliz. E desejar que também faça os outros felizes? O pecuarista que não banca assistência médico-hospitalar para seus peões e gasta fortunas com veterinários para o seu rebanho espera que o próximo tenha também um feliz ano novo?
Na contramão do consumismo, Jung dava razão a são João da Cruz: o desejo busca, sim, a felicidade, "a vida em plenitude" manifestada por Jesus, mas ela não se encontra nos bens finitos ofertados pelo mercado. Como enfatizava o professor Milton Santos, acha-se nos bens infinitos.
A arte da verdadeira felicidade consiste em canalizar o desejo para dentro de si e, a partir da subjetividade impregnada de valores, imprimir sentido à existência. Assim, consegue-se ser feliz mesmo quando há sofrimento. Trata-se de uma aventura espiritual. Ser capaz de garimpar as várias camadas que encobrem o nosso ego.
Porém, ao mergulharmos nas obscuras sendas da vida interior, guiados pela fé e/ou pela meditação, tropeçamos nas próprias emoções, em especial naquelas que traem a nossa razão: somos ofensivos com quem amamos; rudes com quem nos trata com delicadeza; egoístas com quem nos é generoso; prepotentes com quem nos acolhe em solícita gratuidade.
Se logramos mergulhar mais fundo, além da razão egótica e dos sentimentos possessivos, então nos aproximamos da fonte da felicidade, escondida atrás do ego. Ao percorrer as veredas abissais que nos conduzem a ela, os momentos de alegria se consubstanciam em estado de espírito. Como no amor.
Feliz ano novo é, portanto, um voto de emulação espiritual. É claro que muitas outras conquistas podem nos dar prazer e a alegre sensação de vitória. Mas não são o suficiente para nos fazer felizes. Melhor seria um mundo sem miséria, sem desigualdade, sem degradação ambiental, sem políticos corruptos!
Essa infeliz realidade que nos circunda, e da qual somos responsáveis, por opção ou por omissão, se constitui num gritante apelo para nos engajarmos na busca de "um outro mundo possível". Contudo, ainda não será o feliz ano novo.
O ano será novo se, em nós e à nossa volta, superarmos o velho. E velho é tudo aquilo que já não contribui para tornar a felicidade um direito de todos. À luz de um novo marco civilizatório, há que se superar o modelo produtivista-consumista e introduzir, no lugar do PIB, a FIB (Felicidade Interna Bruta), fundada numa economia solidária.
Se o novo se faz advento em nossa vida espiritual, então, com certeza, teremos, sem milagres ou mágicas, um feliz ano novo, ainda que o mundo prossiga conflitivo; a crueldade, travestida de doces princípios; o ódio, disfarçado de discurso amoroso.
A diferença é que estaremos conscientes de que, para ter um feliz ano novo, é preciso abraçar um processo ressurrecional: engravidar-se de si mesmo, virar-se pelo avesso e deixar o pessimismo para dias melhores.

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CARLOS ALBERTO LIBÂNIO CHRISTO, o Frei Betto, 65, frade dominicano, é assessor de movimentos sociais e escritor, autor de "Calendário do Poder" (Rocco), entre outros livros. Foi assessor especial da Presidência da República (2003-2004).

Fonte: Folha SP - 31/12/09 - Tendências e Debates.

30 dezembro, 2009

CLIMATEMPO

Região Sudeste
Capitais - Brasil

Estrutura Geológica, Relevo e Solo

Calendário Cósmico

Um modo didático para expressar a cronologia cósmica é imaginar a vida de quinze bilhões de anos do Universo (ou pelo menos sua forma atual desde a Grande Explosão) condensada em um ano. Em vista disso, cada bilhão de anos da história da Terra corresponderia a mais ou menos 24 dias de nosso ano cósmico, e um segundo daquele ano a 475 revoluções da Terra ao redor do Sol...

DATAS ANTERIORES A DEZEMBRO

Grande Explosão -------------------------- 1º de janeiro
Origem da Via Láctea ---------------------- 1º de maio
Origem do Sistema Solar ------------------- 9 de setembro
Formação da Terra ------------------------ 14 de setembro
Origem da vida na terra --------------------25 de setembro


DEZEMBRO

Primeiros dinossauros ---------------------- 24 de dezembro
Primeiros mamíferos ----------------------- 26 de dezembro
Extinção dos dinossauros ------------------- 28 de dezembro
Primeiros primatas ------------------------- 29 de dezembro
Primeiros seres humanos ------------------- 31 de dezembro

31 DE DEZEMBRO

Primeiros seres humanos ------------------- 22horas e 30 minutos
Numerosas pinturas em
Cavernas na Europa ------------------------ 23 horas e 59 minutos
Império Romano --------------------------- 23 horas, 59 minutos e 56 segundos
Nascimento de Cristo ----------------------- 23 horas, 59 minutos e 58 segundos
Cruzadas ----------------------------------- 23 horas, 59 minutos e 59 segundos
Renascimento na Europa -------------------- 23 horas, 59 minutos e 59 segundos

Fazendo outro tipo de comparação e considerando que o planeta Terra tem entre 4,5 e 5 bilhões de anos, um evento que aconteceu há 80 milhões de anos (idade aproximada das cadeias montanhosas) tem apenas cerca de 1,5% da idade do planeta!
A história geológica da Terra iniciou-se há aproximadamente 4,5 bilhões de anos, na era Pré-Cambriana. A partir do resfriamento superficial do magma, consolidaram-se as primeiras rochas, por isso chamadas magmáticas ou igneas (do radical latino ignis, que da idéia de fogo). A cristalização dos minerais e as transformações da estrutura molecular das rochas deram origem a estruturas geológicas compostas de rochas magmáticas, as quais denominamos escudos cristalinos. Formou-se, assim, a litosfera (do radical grego litbos, que significa pedra ou rocha ou crosta terrestre primitiva). A liberação de gases decorrente do resfriamento originou a atmosfera, responsável pela ocorrência das chuvas e pela formação de lagos e mares nas depressões preenchidas pela água. Assim, iniciou-se a ação do intemperismo ou decomposição química das rochas, processo responsável pela formação dos solos e consequente início da erosão.
As partículas minerais que compõem os solos transportadas pela água, dirigem-se aos lagos e mares, onde a pequena velocidade de escoamento da água possibilita a sedimentação. Ao longo de milhões ou mesmo bilhões de anos, essas depressões foram preenchidas com sedimentos, constituindo as bacias sedimentares, áreas relativamente planas, independentes da altitude. Nessas bacias, são encontradas rochas formadas pela compactação física e química de partículas minerais, denominadas rochas sedimentares.

Tectônica de placas

Atualmente, a crosta terrestre é constituída por cerca de doze placas tectônicas, que ficam literalmente boiando em cima do magma pastoso. Há milhões de anos, quando se iniciou sua movimentação, devia haver menos placas. Ao moverem-se em vários sentidos, pelo fato de o planeta ser esférico, as placas acabaram se encontrando em determinados pontos da crosta e dando origem aos dobramentos modernos, aos terremotos, etc. A palavra tectônica deriva do radical grego tektoniké “ arte de construir”. Assim, ao se movimentarem sobre o magma, desde o final da era Mesozóica, as placas acabaram por se “chocar” em certos pontos, o que determinou, ao longo de milhares de anos, alterações no relevo.
Na faixa de contato entre as placas, seja na zona de formação, em geral nas dorsais oceânicas, ou de destruição, em geral no contato do oceano com o continente, a crosta é frágil, o que permite o escape de magma, originando os vulcões e, em função do atrito, há ocorrência de abalos sísmicos. As placas oceânicas (sima) são pesadas e densas e, tendem a mergulhar sob as placas continentais (sial). Esse fenômeno, conhecido como subducção, dá origem às fossas marinhas ou regiões abissais e ocorre onde há o encontro das placas. Quando a placa oceânica mergulha em direção ao manto, é destruída. Já a placa continental, com a pressão exercida pela placa oceânica, justamente nas porções mais sensíveis da crosta, desde pelo menos a era Mesozóica, através dos movimentos orogenéticos (do grego oros, que quer dizer “montanha”), permitiram o surgimento das grandes cadeias montanhosas do planeta, formadas pelo enrugamento, pelo soerguimento ou pelo dobramento de extensas porções da crosta.
Como esse fenômeno é relativamente recente na história do planeta (ocorreu no fim da era Mesozóica e início da Cenozóica, no período Terciário), convencionou-se denominá-lo de dobramento moderno. Assim, as cadeias dobradas recentemente, como os Andes, o Himaláia, as Rochosas, os Alpes, etc., apresentam elevadas altitudes e forte instabilidade tectônica. Por serem relativamente recentes, acham-se pouco desgastadas e, como ainda estão em construção, tornam-se sujeitas à ação de terremotos e vulcões.
Podemos concluir que, quanto à origem, existem três tipos principais de províncias geológicas no planeta: escudos cristalinos, bacias sedimentares e dobramentos modernos.
Os escudos pré-cambrianos apresentam disponibilidade de minerais metálicos (ferro, manganês, ouro, bauxita, etc.), sendo, por isso, bastante explorados economicamente. Já nos escudos paleozóicos encontram-se minerais não-metálicos (cimento, gesso, etc.). Nos dobramentos modernos, o terreno soerguido pelo movimento das placas pode conter qualquer tipo de minério. As bacias sedimentares são depressões do terreno, preenchidas por fragmentos minerais de rochas erodidas e por sedimentos orgânicos, que no tempo geológico podem transformar-se em combustíveis fósseis. No caso do soterramento de antigos ambientes aquáticos, ricos em plâncton, é possível encontrar petróleo. Já no caso do soterramento de antigas florestas, há a possibilidade de ocorrência de carvão mineral. As principais reservas petrolíferas e carboníferas do planeta datam, respectivamente, das eras Mesozóicas e Paleozóicas. Assim, as bacias sedimentares são importantes províncias onde podem ocorrer combustíveis fósseis de origem orgânica: petróleo, carvão mineral e xisto betuminoso.
A estrutura geológica brasileira é constituída por bacias sedimentares (64%), escudos cristalinos (36%), rochas vulcânicas (4%). Por encontrar-se no meio da placa tectônica sul-americana, o Brasil não possui cadeias montanhosas ou dobramentos modernos. Os escudos cristalinos foram muito desgastados pela erosão, apresentando altitudes modestas e formas arredondadas.
Nosso país é muito rico em recursos minerais metálicos, principalmente nos 40% do território formados por escudos da era Proterozóica. Embora extensas, as bacias sedimentares continentais são pouco exploradas economicamente, apresentando pequena produção de petróleo. As bacias carboníferas do Sul do país, em estágios inferiores de transformação geológica, produzem carvão com menor valor energético que as bacias carboníferas do hemisfério norte. Na plataforma continental, a alguns quilômetros da costa, explora-se petróleo em quantidades significativas. Destaca-se a bacia de Campos, no litoral norte do estado do Rio de Janeiro, responsável por aproximadamente 60% da produção nacional, em 1994.

RELEVO

O relevo corresponde às formas assumidas pelo terreno (serras, montanhas, depressões, chapadas, etc.) após serem moldadas pela atuação de agentes internos e externos sobre a crosta terrestre. Os agentes internos são as forças tectônicas (movimentos orogenéticos, terremotos e vulcanismo), que se originam dos movimentos das placas tectônicas, alterando as formas do terreno na superfície terrestre. Os escudos cristalinos (serras), por exemplo, formam-se nas eras Pré-cambriana e Paleozóica. Suas formas atuais são resultado da modelagem exercida pela ação dos agentes externos ou agentes erosivos (chuva, vento, rios, gelo, neve, etc.), atuando durante milhões de anos sobre as formas definidas pelos agentes internos. Já as cadeias montanhosas terciárias são resultantes da ação dos agentes internos (orogênese).
Embora existam classificações anteriores, somente na década de 40 foi criada uma classificação do relevo brasileiro considerada coerente com a realidade do nosso território. Ela foi elaborada pelo professor Aroldo de Azevedo e levava em conta as cotas altimétricas, definindo planalto como um terreno levemente acidentado, com mais de 200 metros de altitude, e planície como uma superfície plana, com altitude inferior a 200 metros. O Brasil tem oito unidades de relevo. Os planaltos ocupam 59% da superfície do território, e as planícies, os 41% restantes.
No final da década de 50, o professor Aziz Ab’Sáber, discípulo de Aroldo de Azevedo, promoveu alteração nos critérios de definição dos compartimentos do relevo. A partir de então, passou-se a considerar planalto uma área em que os processos de erosão superam os de sedimentação, e planície, uma área mais ou menos plana, em que os processos de sedimentação superam os de erosão, independentemente das cotas altimétricas.
No território distinguem-se três compartimentos:
I - Planalto: é um compartimento de relevo com superfície irregular e altitude superior a 300 metros, no qual predominam processos erosivos em terrenos cristalinos ou sedimentares.
II - Planície: é um compartimento de relevo com superfície plana e altitude igual ou inferior a 100 metros, no qual predominam acúmulos recentes de sedimentos.
III - Depressão: é um compartimento de relevo mais plano que o planalto, no qual predominam processos erosivos, com suave inclinação e altitude entre 100 e 500 metros.


O relevo submarino

No relevo submarino, podemos distinguir:

I - Plataforma continental: é a continuação do relevo e da estrutura geológica continental abaixo do nível do mar, onde aparecem as ilhas continentais ou costeiras, de origem vulcânica, tectônica ou biológica. Por apresentar profundidades modestas, há penetração de luz solar, criando condições propícias ao desenvolvimento da vegetação marinha, o que torna a plataforma muito importante para o desenvolvimento da atividade pesqueira. As depressões do terreno na plataforma continental tornam-se, ao longo do tempo geológico, bacias sedimentares importantíssimas para a exploração de petróleo em águas oceânicas.
II - Talude: é o fim do continente, onde há o encontro da crosta continental com a crosta oceânica, formando desníveis de profundidade variável, que chegam a atingir 3 mil metros. As fossas marinhas são depressões abissais que aparecem abaixo do talude, em zonas de encontro de placas tectônicas.
III - Região pelágica: é o relevo submarino propriamente dito, onde encontramos depressões, montanhas tectônicas e vulcânicas, planícies, etc. Na região pelágica, aparecem as ilhas oceânicas.

SOLO

Uma rocha qualquer, ao sofrer intemperismo, transforma-se em solo, adquire maior porosidade e, como decorrência, há penetração de ar e água, o que cria condições propícias para o desenvolvimento de formas vegetais e animais. Estas, por sua vez, passam a fornecer matéria orgânica à superfície do solo, aumentando cada vez mais sua fertilidade. Assim, o solo é constituído por rocha intemperizada, ar, água e matéria orgânica, formando um manto de intemperismo que recobre superficialmente as rochas da crosta terrestre.
A matéria orgânica, fornecida pela fauna e pela flora decompostas, encontra-se concentrada apenas na camada superior do solo. Essa camada é chamada de horizonte A, o mais importante para a agricultura, dada a sua fertilidade. Logo abaixo, com espessura variável de acordo com o clima, responsável pela intensidade e velocidade da decomposição da rocha, encontramos rocha intemperizada, ar e água, que formam o horizonte B. Em seguida, encontramos rocha em processo de decomposição – horizonte C – e, finalmente, a rocha matriz – horizonte D -, que originou o manto de intemperismo ou o solo que a recobre. Sob as mesmas condições climáticas, cada tipo de rocha origina um tipo de solo diferente, ligado à sua constituição mineralógica: do basalto, por exemplo, originou-se a terra roxa; do gnaisse, o solo de massapê, e assim por diante.
É importante destacar que solos de origem sedimentar, encontrados em bacias sedimentares e aluvionais, não apresentam horizontes, por se formarem a partir do acúmulo de sedimentos em uma depressão, e não por ação do intemperismo, mas são extremamente férteis, por possuírem muita matéria orgânica.
O principal problema ambiental relacionado ao solo é a erosão superficial ou desgaste, que ocorre em três fases: intemperismo, transporte e sedimentação.
Os fragmentos intemperizados da rocha estão livres para serem transportados pela água que escorre pela superfície (erosão hídrica) ou pelo vento (erosão eólica). No Brasil, o escoamento superficial da água é o principal agente erosivo e, sendo o horizonte A o primeiro a ser desgastado, a erosão acaba com a fertilidade natural do solo.
A intensidade da erosão hídrica está diretamente ligada à velocidade de escoamento superficial da água: quanto maior a velocidade de escoamento, maior a capacidade da água de transportar material em suspensão; quanto menor a velocidade, mais intensa a sedimentação.
A velocidade de escoamento depende da declividade do terreno e da densidade da cobertura vegetal. Em uma floresta a velocidade é baixa, pois a água encontra muitos obstáculos (raízes, troncos, folhas) à sua frente e, portanto, muita água se infiltra no solo. Em uma área desmatada, a velocidade de escoamento superficial é alta e a água transporta muito material em suspensão, o que intensifica a erosão e diminui a quantidade de água que se infiltra no solo.
Assim, para combater a erosão superficial, há dois caminhos: manter o solo recoberto por vegetação ou quebrar a velocidade de escoamento utilizando a técnica de cultivo em curvas de nível, seja seguindo as cotas altimétricas na hora da semeadura, seja plantando em terraços.
Para a conservação dos solos, deve-se evitar a prática das queimadas, que acabam com a matéria orgânica do horizonte A. Somente em casos especiais, na agricultura, deve-se utilizar essa prática para combater pragas ou doenças.Um problema natural relacionado aos solos de clima tropical, sujeitos a grandes índices pluviométricos, é a erosão vertical, representada pela lixiviação e pela laterização. A água que se infiltra no solo escoa através dos poros, como em uma esponja, e vai, literalmente, levando os sais minerais hidrossolúveis (sódio, potássio, cálcio, etc.), o que retira a fertilidade do solo. Essa “lavagem” chama-se lixiviação. Paralelamente a esse processo, ocorre a laterização ou surgimento de uma crosta ferruginosa, a laterita – popularmente chamada de canga no interior do Brasil - , que em certos casos chega a impedir a penetração das raízes no solo.

11 de Setembro - Noam Chomsky

11 de Setembro - Noam Chomsky

Posfácio
Reflexões

Tem sido uma opinião amplamente disseminada que os ataques terroristas de 11 de setembro mudaram drasticamente o mundo, que nada será como antes, já que o mundo entra agora numa “era do terror” – aliás, este é o título de uma antologia de ensaios acadêmicos, publicados pelos scholars da Universidade de Yale, e outros, que consideraram os ataques com Anthrax ainda mais execráveis.
Não há nenhuma dúvida de que as atrocidades de 11 de setembro constituíram um evento de importância histórica. Não – lamentavelmente – por sua dimensão, e sim pela escolha de vítimas inocentes. Já se assumiu há algum tempo que, com as novas tecnologias, as potências industriais, provavelmente, perderão, na prática, o seu monopólio sobre a violência, retendo para si apenas uma enorme supremacia. Ninguém poderia ter previsto o modo tão específico como essas expectativas foram correspondidas, mas o fato é que o foram. Pela primeira vez, na história moderna, a Europa e seus agregados foram vítimas, em solo pátrio, da mesma espécie de atrocidades que, rotineiramente, promoveram no exterior. A história destes episódios ainda deve estar próxima demais para ser revista, e portanto o Ocidente pode muito bem preferir desconsiderá-la, mas as vítimas não o farão. A ruptura radical com o padrão tradicional, por certo, confere ao 11 de setembro o status de um evento histórico, e as suas repercussões serão bastante significativas.
Inúmeras questões cruciais foram levantadas ao mesmo tempo:

1 – Quem é o responsável?
2 – Quais seriam os motivos?
3 – Qual seria a reação mais adequada?
4 – Quais seriam as conseqüências a longo prazo?

Quanto à primeira pergunta, presumiu-se, de um modo bastante plausível, que os culpados seriam bin Laden e sua rede, a Al-Qaeda. Ninguém os conhece melhor do que a CIA, a qual, juntamente com as organizações que lhe são correspondentes entre os aliados dos EUA, saíram recrutando islâmicos radicais em diversos países e os organizaram como uma força militar e terrorista, e não para ajudar os afegãos a resistir à agressão russa, que seria um objetivo legítimo, mas, por razões corriqueiras de Estado, com cruéis conseqüências para os afegãos, depois que o Mujahiddin tomou conta da situação. A inteligência dos EUA, sem nenhuma dúvida, tem acompanhado bem de perto outros atos praticados por essas redes, desde o assassinato do Presidente Sadat, do Egito, 20 anos atrás, e com mais intensidade depois da tentativa de explodir o World Trade Center e muitos outros alvos, numa operação terrorista bastante ambiciosa, em 1993.
No entanto, a despeito do que deve ser a maior investigação promovida pela inteligência internacional em toda a História, tem-se mostrado dificílimo encontrar qualquer prova que determine quem foram os perpetuadores dos atentados de 11 de setembro. Oito meses depois dos atentados, o diretor do FBI, Robert Mueller, depondo no Congresso, pôde apenas dizer que a inteligência americana agora “acredita” que os ataques foram tramados no Afeganistão, embora planejados e deflagrados de algum outro lugar. E muito depois de descobrirem que o Anthrax é originário dos laboratórios bélicos do governo dos EUA, os responsáveis ainda não foram identificados. Tudo isso nos leva a compreender o quanto é difícil contra-atacar dos atos de terrorismo visando os ricos e poderosos, no futuro. No entanto, e mesmo a despeito da fragilidade das provas, a conclusão inicial a respeito do 11 de setembro pode se considerada correta.
Já quanto ao item 2, os estudiosos no assunto são praticamente unânimes em tomar ao pé da letra as palavras dos terroristas, que inclusive correspondem a seus atos dos últimos 20 anos: o objetivo deles, da maneira como entendem o problema, é expulsar os infiéis dos territórios muçulmanos, derrubar os governos corruptos instalados e sustentados por estes infiéis e instituir a versão extremista do Islã.
Um dado mais significativo, pelo menos para aqueles que esperam diminuir a possibilidade de que ocorram crimes similares, são as condições históricas em que o terrorismo nasce, e que lhes proporciona uma reserva em massa de solidariedade e compreensão para, no mínimo, parte de sua mensagem, e isso mesmo entre os que os desprezam e temem. Nas palavras patéticas de George Bush, “Por que será que nos odeiam?”, a questão não é absolutamente nova nem é tão difícil assim encontrar a resposta. Quarenta e cinco anos atrás, o presidente Eisenhower e sua equipe já discutiam o que chamavam de “uma campanha de ódio contra nós, no mundo árabe, não da parte dos governos, mas no povo”. A razão básica, e sobre isso fomos advertidos pelo próprio Conselho de Segurança Nacional, é o fato de os EUA apoiarem governos brutais e corruptos que não permitem nem a democracia nem o desenvolvimento, e fazem isso por conta da preocupação de “proteger os seus interesses sobre o petróleo do Oriente Médio”. The Wall Street Journal encontrou praticamente a mesma postura quando levantou a opinião de muçulmanos ricos, ocidentalizados, depois do 11 de setembro, sentimentos agora exacerbados por culpa de políticas específicas dos EUA em relação a Israel-Palestina e ao Iraque.
Os analistas geralmente preferem uma resposta mais cômoda: o ódio origina-se do ressentimento em relação a nossa liberdade e nosso amor pela democracia, suas imperfeições culturais sendo rastreadas desde séculos atrás, sua incapacidade de se inserir na forma de globalização ( da qual, eles, com satisfação, participam), e outras deficiências semelhantes. Mais cômoda; entretanto, talvez, pouco sábia.
Quanto à reação, sua terceira pergunta, a resposta é, sem dúvida, controvertida, mas pelo menos podemos afirmar que a reação deveria estar em acordo com os padrões morais mais elementares: se uma ação é certa em relação a nós, é certa para os outros; se é errada em relação aos outros, é errada para nós. Aqueles que rejeitam esse padrão declaram abertamente que as ações se justificam pelo poder de praticá-las; mas estes podem ser ignorados em qualquer discussão sobre a adequação das ações, de certo e errado. Alguém pode vir a perguntar o que restaria de toda a enxurrada de análises sobre a questão 3 (debates sobre “guerra justa” etc...) se este simples critério for adotado.
Para ilustrar com alguns poucos casos imunes a controvérsia, 40 anos se passaram desde que o presidente Kennedy ordenou que “os terrores da terra” fossem despejados sobre Cuba até que a liderança do país fosse eliminada, já que haviam tido a descortesia de ser bem-sucedidos em repelir uma invasão organizada pelos EUA. Com efeito, os mencionados terrores foram extremamente severos, mantendo-se pela década de 1990 afora. Vinte anos se passaram, desde que o presidente Reagan deflagrou uma guerra terrorista contra a Nicarágua, conduzida à base de bárbaras atrocidades e destruição disseminada, deixando dezenas de milhares de mortos, e o país, arruinado, talvez a um ponto irrecuperável – mas levando também a uma condenação dos EUA, por terrorismo internacional, pela Corte Mundial e pelo Conselho de Segurança da ONU (uma resolução vetada pelos EUA). No entanto, nem por isso há quem acredite que Cuba e Nicarágua tenham o direito de lançar bombas sobre Washington ou Nova York, ou de assassinar líderes políticos. E seria bastante fácil acrescentar diversos outros casos, ainda mais graves, chegando até o presente.
Considerando tudo isso, aqueles que aceitam padrões morais elementares têm algum trabalho ainda por fazer caso pretendam demonstrar que os EUA e a Inglaterra estiveram agindo corretamente ao bombardear os afegãos, de modo a obrigá-los a entregar pessoas que estariam sob suspeita dos EUA como responsáveis pelas atrocidades cometidas, o objetivo oficial da guerra, anunciado pelo presidente, quando o bombardeio começou, ou a derrubar seus mandatários, o objetivo anunciado muitas semanas mais tarde.
Os mesmos padrões morais impõem propostas mais ricas em nuanças quanto a quais seriam as respostas mais apropriadas às atrocidades terroristas. Michael Howard, o respeitado especialista em história militar anglo-americana, propôs: “uma operação policial conduzida sob os auspícios das Nações Unidas... contra uma conspiração criminal cujos membros deveriam ser caçados, presos, trazidos diante de uma corte internacional, onde receberiam um julgamento justo e, se declarados culpados, sentenciados na medida apropriada”(Guardian, Foreign Affairs). Isso parece bastante razoável, embora possamos perguntar qual seria a reação a tal sugestão caso a proposta fosse aplicada universalmente. Tal coisa seria impensável e, se tal sugestão chegasse a ser formulada, causaria apenas ultraje e horror.
Questões similares foram levantadas com relação à “Doutrina Bush” de “ataques preventivos” contra alvos sob suspeita de representarem alguma ameaça. Deve-se destacar que tal política não é uma novidade. Seus estrategistas de mais alto nível são, em sua maioria, remanescentes da administração Reagan, que argumentavam que o bombardeio à Líbia era justificável perante a Carta da ONU como “legítima defesa diante de um ataque futuro”. Os estrategistas de Clinton aconselharam “ataques preventivos” (incluindo ser o primeiro a lançar um ataque nuclear). E a doutrina tem seus antecedentes mais remotos. No entanto, a audácia de afirmar tal coisa com um direito é novidade, e não há segredo algum sobre a quem a ameaça é endereçada. O governo e os comentaristas estão enfatizando o mais claramente possível que se pretende aplicar a doutrina no Iraque. O elementar padrão de universalidade, entretanto, poderia ser utilizado aqui para justificar um terror preventivo contra os EUA. Claro, ninguém aceita uma tal conclusão. Mas, se estamos tão desejosos de adotar princípios morais elementares, questões óbvias podem ser levantadas e devem ser enfrentadas por aqueles que advogam ou toleram uma versão seletiva da doutrina da “reação preventiva”, que garanta tal direito exclusivamente àqueles que sejam poderosos o bastante para exercitá-lo, sem grande consideração pelo que o mundo possa pensar. E o ônus da prova não é leve – aliás, isso é algo que ocorre com freqüência, quando vemos a ameaça ou o uso da violência ser advogado ou tolerado.
Há, é claro, uma réplica simplista contra tais argumentos: NÓS somos bons, ELES são maus. Esse utilíssimo princípio bate praticamente qualquer outro argumento. As análises de alguns comentaristas, assim como de estudiosos, têm suas raízes neste princípio tão crucial quanto corrente, o qual não é sequer defendido, mas apenas afirmado. Vez por outra, embora raramente, algumas criaturas irritantes tentam contrapor-se ao cerne deste princípio apresentando um relato da história recente e da contemporânea. Aprendemos mais sobre normas culturais predominantes observando a reação e a interessante disposição de barreiras erguidas com o propósito de deter qualquer desvio que resvale para uma tal heresia. Nada disso, obviamente, é uma invenção dos centros de poder contemporâneos e da cultura intelectual dominante. No entanto, merece atenção, pelo menos daqueles que tenham algum interesse em compreender onde nos posicionamos e o que pode vir pela frente.
Vamos tratar resumidamente das últimas considerações: questão (4).
A longo prazo, suspeito que os crimes de 11 de setembro irão acelerar tendências que já estavam em curso: a Doutrina Bush, aqui apenas mencionada, é um exemplo disso. Como já se previra anteriormente, alguns governos ao redor do mundo aproveitaram-se do 11 de setembro como uma oportunidade para instituir ou intensificar programas duramente repressivos. A Rússia ficou muito satisfeita em unir-se à “coalizão contra o terror”, esperando com isso receber autorização para executar suas terríveis atrocidades na Chechênia, e não ficou desapontada. A China também aderiu, com alegria, e pelas mesmas razões. A Turquia foi o primeiro país a oferecer tropas para a nova fase da “Guerra contra o Terror”, como sinal de gratidão, assim declarou seu primeiro-ministro, à colaboração dos EUA à campanha do Governo Turco na sórdida repressão contra a população curda, levada a cabo com extrema crueldade e crucialmente apoiada pelo fluxo de armas provido pelos EUA. A Turquia foi bastante elogiada por suas vitoriosas campanhas de terrorismo promovido pelo Estado, inclusive algumas das piores atrocidades dos sombrios anos 1990, e foi recompensada pela avaliação de sua jurisdição sobre Kabul, quanto a protegê-la contra o terrorismo, por parte da mesma superpotência que forneceu os recursos militares, bem como apoio diplomático e ideológico para suas recentes atrocidades. Já Israel, de imediato, percebeu que teria a oportunidade de esmagar os palestinos, atacando-os então com brutalidade ainda maior e contando com apoio ainda mais sólido por parte dos EUA. E por aí vamos, a mesma coisa se repetindo pelo mundo todo...
Mais sociedades democráticas, incluindo aí os EUA, instituíram medidas para impor disciplinas às sua próprias populações e para instituir medidas impopulares sob o disfarce de “combate ao terror”, explorando sempre a atmosfera de medo e o apelo ao “patriotismo”... o que, na prática, significa: “Você, cale a boca, enquanto eu toco as coisas ao meu jeito, impiedosamente.” A administração Bush se valeu da oportunidade para fazer avançar seu ataque contra a maioria da população, e contra as gerações futuras, a serviço de escusos interesses corporativos que dominam a administração, superando qualquer parâmetro anterior.
Em suma, as previsões do primeiro momento foram amplamente confirmadas.
Como resultado efetivo, os EUA, pela primeira vez, têm bases militares de monta na Ásia Central. São importantes para posicionar favoravelmente as forças multinacionais americanas dentro do panorama atual do “grande jogo”, de modo a controlar os consideráveis recursos da região, mas também para completar o cerco em torno das principais fontes de energia do mundo, na região do Golfo. O sistema de bases americanas tendo como alvo o Golfo se estende do Pacífico aos Açores, mas a base confiável mais próxima, antes da Guerra do Afeganistão, era Diego Garcia. Agora, a situação melhorou muito, e uma intervenção de força, se for julgada apropriada, será enormemente facilitada.
A administração Bush entende a nova fase da “guerra contra o terror” (que, de muitos modos, reproduz a “guerra contra o terror” declarada pela administração Reagan, vinte anos antes) como uma oportunidade de expandir sua já excepcional vantagem militar sobre o resto do mundo e poder adotar novos métodos para lhe assegurar a dominação do planeta. O pensamento do governo foi articulado claramente pelos altos escalões quando o príncipe Abdullah, da Arábia Saudita, visitou os EUA, em abril, para instar o governo a prestar mais atenção às reações do mundo árabe ao seu irrestrito apoio à repressão e ao terror praticados por Israel. Na ocasião, foi-lhe dito que, efetivamente, os EUA não dão a mínima para a opinião dele e para a dos demais árabes. Como noticiou The New York Times, um alto funcionário explicou que “se pensam que éramos poderosos durante a Tempestade no Deserto, estamos dez vezes mais poderosos agora. Isso foi só para lhe dar uma idéia do que Afeganistão demonstrou sobre nossa capacidade”. Um veterano analista da área de defesa resumiu com precisão: “Todos eles vãos nos respeitar, por saberem que somos do tipo que bate forte, e não vão mais brincar conosco.” Também este padrão tem muitos precedentes históricos, mas no mundo pós 11 de setembro ganha um novo significado.
Não temos acesso aos documentos internos, mas é razoável especular que tais conseqüências estavam já embutidas nos propósitos iniciais do bombardeio ao Afeganistão: um aviso ao mundo sobre o que os EUA podem fazer se alguém sair da linha. O bombardeio à Servia foi empreendido por razões similares. Seu objetivo principal foi “garantir a credibilidade da OTAN”, como Blair e Clinton explicaram – sem estar se referindo à credibilidade da Noruega ou da Itália, mas a dos EUA e de seu principal cliente militar. Trata-se aqui de um tema comum na condução dos negócios de Estado e na literatura das relações internacionais; e, com alguma razão, como a história fartamente revela.
Sem me alongar, as questões básicas da sociedade internacional, ao que me parece, continuam as mesmas, mas o 11 de setembro com toda a certeza provocou mudanças, em alguns casos, com implicações significativas e nada agradáveis.

Fonte: Chomsky, Noam. 11 de Setembro. Ed. Bertrand Brasil, 2002.

A Política de Poder da China no Século XXI

A Política de Poder da China no Século XXI

Por Michael Wallace Ataíde(1) - 08/12/08

INTRODUÇÃO

Este artigo tem o objetivo de analisar a política internacional da China neste início do século XXI. A hipótese básica deste artigo sustenta que a política internacional de uma grande potência, como é o caso da China, é pautada por orientações realistas levando em consideração que esse Estado busca a maximização do poder, tanto no plano militar como no plano econômico, e que naturalmente essa busca pelo poder pressupõe uma busca incessante pela segurança e sobrevivência na cena internacional.
Este paper está dividido em três partes, onde na primeira parte faz-se uma breve análise e discussão sobre o realismo político como escola de pensamento e formulação de política internacional. Na segunda parte analisa-se a China como futura grande potência e que esse Estado usará a sua força e influência política e econômica para atingir os seus mais imediatos objetivos. A última parte é uma conclusão onde faz-se uma breve discussão sobre a política do poder de grandes potências a partir da análise de influentes estudiosos das relações internacionais e que esses pressupostos podem ser aplicados à China como grande potência. Mesmo havendo outras importantes variáveis como comércio, etc., a conclusão é que a política de poder se sobressai em relações internacionais.

O REALISMO POLÍTICO ESTÁ EM CRISE?

Muitos intelectuais escreveram imediatamente a queda da União Soviética que o realismo político não tinha mais razão de existir como orientação política para os Estados, em especial para as grandes potências(2). O argumento desses autores era baseado no fato de que com a queda da União Soviética, os Estados Unidos regeria hegemônico o sistema internacional, e que, portanto, a paz, o comércio e a democracia seria o fio norteador da política internacional.
Para muitos autores, o fim da Guerra-Fria significaria a existência do mundo ideal onde a cooperação era a grande característica nas relações internacionais, e não a competição pela segurança e o conflito(3), e que naturalmente observaríamos a ascensão de Estados outrora autoritários aderindo ao modelo de democracia liberal como o modelo político ideal, pois assim as guerras e os conflitos cessariam já que Estados democráticos não travam guerras entre si. Assim, o realismo político, segundo os analistas que defendem essa visão otimista das relações internacionais, não tinha mais poder explicativo e que essa escola de pensamento apenas serviria para explicar as relações internacionais até o fim do embate ideológico entre os Estados Unidos e a União Soviética.
Para eles, o pensamento realista estava obsoleto e fundamentalmente irrelevante para as novas realidades da política internacional(4). No entanto, a dinâmica do plano internacional mostrou que esses autores estavam equivocados, forçando muitos deles a reverem os seus conceitos(5) sobre política internacional. O realismo político ainda é uma influente escola de pensamento e de formulação de política externa, e é a partir dos pressupostos dessa escola que os Estados atuam num sistema internacional pautado pela anarquia(6) entre os Estados.

O COLOSSO CHINÊS: COMPETIÇÃO E BUSCA PELA SEGURANÇA E HEGEMONIA NO SISTEMA INTERNACIONAL

Hoje, olhando com mais pragmatismo para a cena internacional, em especial para o continente asiático, percebemos que está surgindo ou ressurgindo, um “colosso” militar e econômico chamado China. Segundo muitos influentes autores de política internacional(7), a China aparecerá no teatro internacional como um grande problema para outras grandes potências como os Estados Unidos, a Rússia e o Japão.
Mearsheimer, em seu célebre estudo sobre as grandes potências(8), argumenta que muitos americanos poderão considerar que o realismo como uma orientação política está obsoleta e que não mais serve para analisar as relações internacionais, como colocado acima, mas que essa percepção não tem lugar comum no pensamento dos líderes chineses, pelo contrário, esses líderes e pensadores chineses enfatizam que a China será “o expoente máximo da Realpolitik no mundo pós Guerra-Fria(9)”. O autor chama a atenção para uma análise da China nos últimos 150 anos e o seu presente de ameaça, e argumenta que o Estado chinês partilha fronteiras com treze Estados nos quais algumas dessas fronteiras ainda se encontram em disputa, como por exemplo, na Índia, na Rússia, e no Vietnã. A China também reclama a posse de Taiwan, das Ilhas Senkaku/Diaoyutai, além de vários grupos de ilhas no mar da China Meridional(10). Portanto, essas “pendências” territoriais é um pressuposto para num futuro próximo a China usar a diplomacia dos canhões para reaver esses territórios, mas com algumas ressalvas, é claro, pois três Estados (Rússia, Índia e Paquistão) com os quais a China tem contenciosos territoriais dispõe de arsenal nuclear, o que teoricamente poderia conter a China, mas que numa análise realista, isso não impede que a China considere todas as opções, inclusive a militar, para dissuadir esses Estados e atingir o seu fim, ou os seus objetivos mais imediatos.
Além dessas questões colocadas acima, a China está começando a olhar para o Japão e para os Estados Unidos com certo desprezo, ou se preferir como inimigos potenciais. No caso do primeiro, em especial, porque as lembranças das agressões anteriores ainda estão vivas na memória dos líderes chineses(11). Segundo Mearsheimer(12) os líderes políticos chineses receiam que o Japão se torne novamente uma potência militarista como foi antes de 1945. Essa análise deve ser seriamente considerada, tendo em vista que os guardiões do território japonês, a saber, os Estados Unidos, estão passando por um momento delicado na sua história, com graves crises do seu sistema financeiro, duas guerras sem legitimidade, uma no Iraque e outra no Afeganistão, além dos problemas internos como saúde, educação, sistema previdenciário, etc. Tudo isso são elementos para fazer com que os Estados Unidos retirem o seu guarda chuvas de cima do território japonês, obrigando assim os líderes japoneses a reativarem a sua indústria e política bélica. Essa análise vale para todos os Estados que confia aos Estados Unidos a sua defesa e soberania, como Israel, por exemplo.
Igualmente sérias são as relações futuras com os Estados Unidos. Os formuladores de política externa chineses têm a preocupação de que os Estados Unidos estejam empenhados em impedir que China o supere, economicamente e militarmente, vindo a se tornar uma superpotência mundial, ou mesmo regional, e acabe por dominar Estados asiáticos que estão sob zona de influencia estadunidense, como a Coréia do Sul e o Japão, por exemplo. Além disso, analistas de segurança internacional e defesa chineses “estão convencidos de que as alianças norte-americanas com países asiáticos, particularmente com o Japão, representam um desafio sério e de longo prazo, se não mesmo uma ameaça, à segurança nacional, unificação e modernização da China(13)”.
Para sustentar a sua política dissuasória, a China está investindo pesadamente em tecnologia militar. Em 2001 esse Estado aumentou o seu orçamento de defesa em 17,7%(14), o que representa a maior expansão em termos de recursos destinados à defesa nas últimas décadas. Esse aumento pode ser considerado reflexo da magnificação da sua economia e do excedente financeiro. A maior parte desses recursos está sendo empregados na construção de mísseis balísticos e de tecnologia nuclear, com o claro objetivo de modernizar o seu arsenal atômico.
Essa estrondosa ascensão política e econômica da China está incomodando muitos formuladores de política externa estadunidense, pois observam que uma China ainda mais poderosa do que se encontra hoje pode ser uma séria ameaça para a hegemonia dos Estados Unidos no cenário internacional, podendo minar a influência norte-americana ao redor do planeta. Mearsheimer observa que “o cenário mais perigoso que os Estados Unidos poderão vir a enfrentar no início do século XXI é a China tornar-se um potencial Estado hegemônico no Nordeste Asiático(15)”. O autor segue argumentando que um fator determinante para a China se tornar um Estado hegemônico em nível mundial vai depender de sua economia continuar crescendo ao ritmo de 10% a.a. Se isso acontecer, provavelmente a China se tornará não só um produtor importante de tecnologias de grande complexidade, como passará a usar esses recursos tecnológicos para desenvolver e modernizar o seu arsenal militar(16).

CONCLUSÃO

Conclui-se, portanto, que a política de poder(17) ainda é uma variável determinante nas relações internacionais, e os Estados não cessarão em buscá-lo com o intuito de atingir os seus objetivos individuais mais imediatos. Como afirma categoricamente Martin Wight em A Política do Poder, “as potências, continuarão a buscar a segurança sem se referirem à justiça, bem como perseguir os seus interesses vitais sem levar em consideração interesses comuns(18)”. Na mesma linha argumenta Hans Morgenthau em A política entre as Nações que “a política internacional, como toda a política, consiste em uma luta pelo poder. Sejam quais forem os fins da política internacional, o poder constitui sempre o objetivo imediato(19)”. Assim, pode-se dizer que a China se tornando uma potência internacional com poder econômico e militar ainda maior, não hesitará em usar sua força para atingir os seus mais imediatos objetivos. Evidentemente que esse país faz parte de um sistema internacional onde às trocas comerciais, a economia e a interdependência são variáveis importantes e que fazem parte do jogo dos Estados, mas ainda assim quando o que estiver em disputa nesse jogo forem os interesses imediatos, a política de poder prevalecerá.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

CHRISTENSEN, Thomas J. Chinese Realpolitik. Foreign Affairs 75, nº5, Setembro-Outubro de 1996.
FUKUYAMA, Francis. The end of History end the Last Man. New York: Free Press, 1992.
KENNEDY, Paul. Ascensão e Queda das Grandes Potências: transformação econômica e conflito militar de 1500 a 2000. Tradução Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Elsevier, 1989, 17 ed.
MEARSHEIMER, John. A Tragédia da Política das Grandes Potências. Tradução: Tiago Araújo. Lisboa: Ed. Gradiva, 2007.
MORGENTHAU, Hans J. A política entre as Nações. Tradução Oswaldo Biato. Brasília: Ed. UNB, 2002.
POMFRET, John. China Plans Major Boost in Defense Spending for Military. Washington Post, 6 de Março de 2001.
WIGHT, Martin. A Política do Poder. Tradução Carlos Sérgio de Oliveira. Brasília: Ed. UNB, 2002.
NOTAS
(1) Mestrando como aluno especial no programa de pós-graduação em História Social da Universidade de São Paulo.
(2)Ver Francis Fukuyama in The end of History end the Last Man.
(3) Mearsheimer, John. A Tragédia da Política das Grandes Potências. Gradiva, 2001.
(4) Mearsheimer, John. A Tragédia da Política das Grandes Potências. Gradiva, 2001. Pág. 337.
(5) Ver Francis Fukuyama in America at the Crossroads: Democracy, Power and Neoconservative Legacy.
2006
(6) Anarquia internacional é aqui entendida como a falta de um governo mundial, ou seja, um Estado acima dos Estados.
(7) Mearsheimer, John. A Tragédia da Política das Grandes Potências. Gradiva, 2001. Pág. 350.
(8) Ibidem, 350.
(9) Thomas J. Christensen. Chinese Realpolitik. Foreign Affairs 75, nº5, Setembro-Outubro de 1996, p. 37.
(10) Mearsheimer, John. A Tragédia da Política das Grandes Potências. Gradiva, 2001. Pág. 350.
(11) Ver Paul Kennedy in Ascensão e Queda das Grandes Potências. Ed. Campus, 1989.
(12) Ibidem, 350.
(13) Ibidem, 351.
(14) Ver John Pomfret. China Plans Major Boost in Defense Spending for Military. Washington Post, 6 de Março de 2001.
(15) Ver Mearsheimer, John. A Tragédia da Política das Grandes Potências. Gradiva, 2001. Pág. 373.
(16) Ibidem, 373.
(17) Para um estudo aprofundado sobre a política de poder ver Hans Morgenthau in A Política entre as Nações. Ed. UNB, 2003. Martin wight in A Política do Poder. Ed. UNB, 2002.
(18) Martin wight in A Política do Poder. Ed. UNB, 2002, pág. 310.
(19) Hans Morgenthau in A Política entre as Nações. Ed. UNB, 2003, pág. 49.

Como Estudar Geografia para o Vestibular


As questões das provas dos principais vestibulares de Geografia avaliam a capacidade do candidato de entender e aplicar os princípios básicos desta disciplina. Portanto, ao estudar qualquer assunto de Geografia lembre-se de que todos os espaços geográficos devem ser:

Localizados – há um intenso uso de mapas e para interpretá-los você deve investir um bom tempo no estudo de Cartografia. As questões avaliam a capacidade de leitura dessa linguagem e de seu sistema de símbolos específicos.
Comparados – embora os diferentes espaços geográficos tenham suas particularidades, é essencial comparar o que se está estudando com outros lugares. Muitas questões exploram analogias, avaliando o grau de entendimento das leis geográficas.
Explicados – todos os fatos geográficos têm causas e consequências, por isso a maioria das questões avalia o conhecimento sobre a formação dos espaços geográficos e as consequências disso.
Relacionados – os fatos geográficos não acontecem de forma isolada. Eles se conectam às condições naturais e sociais do lugar onde ocorrem , o que explica o grande uso de questões interdisciplinares que relacionam os conhecimentos geográficos com outras informações.
Dinamizados – não existe um espaço geográfico estático. Tudo está em perpétua mutação, embora muitas vezes as mudanças não possam ser percebidas na escala de tempo de nossa vida (anos). Assim, cuidado com as questões que utilizam diferentes escalas de tempo que avaliam a sua capacidade e entender as diferentes dinâmicas do espaço geográfico.

Para realizar um bom estudo de Geografia, você deve considerar os cinco princípios apontados acima e seguir as seguintes orientações:

Estude com a meta de alcançar uma visão completa e abrangente de todos os tópicos do programa. A maior parte das questões avalia a abrangência de seus conhecimentos geográficos, e não sua especificidade.
Entenda as interdisciplinaridades. Os fatos geográficos não são isolados; estão inseridos em contextos naturais e sociais que envolvem conhecimentos de outras disciplinas.
Identifique os vocábulos específicos da Geografia e certifique-se de tê-los entendido. Cada ciência tem seu vocabulário próprio e as questões de vestibular utilizam e avaliam seu conhecimento dessa terminologia, em especial nas provas escritas.
Use mapas procurando visualizar no espaço geográfico os fatos que estão sendo estudados. Estabeleça nexos lógicos com outros fatos regionais ou mundiais.
Relacione o que está estudando com o que você já sabe, procurando tirar dessas relações leis geográficas que expliquem a realidade local ou regional. A visão global do espaço geográfico deve ser acompanhada do conhecimento de seus aspectos específicos.
Avalie sua capacidade de analisar – de forma crítica e coerente – a produção e a transformação de mundo contemporâneo, marcado pela alta instabilidade das fronteiras. Esse tema tem sido usado em muitas questões, quase todas baseadas em análise de textos ou interpretação de mapas.
Identifique as relações entre a realidade brasileira e os processos gerais que regem o mundo contemporâneo no que se refere à natureza e à sociedade.
Entenda a alteração que a noção de tempo e espaço geográfico está sofrendo. Muitas questões abordam a evolução das tecnologias de comunicações e de transportes que aumentam a velocidade de ligação dos diferentes pontos do espaço mundial e ampliam a integração de pessoas e mercados.
Analise a construção dos espaços geográficos, pensando nas transformações que são impostas ao meio ambiente. Esse tem sido o assunto de algumas das mais difíceis questões das provas de Geografia e está relacionado às transformações do modo de vida das sociedades contemporâneas.

Fonte: Conhecimento Prático - Geografia / Autor: Reinaldo Scalzaretto

29 dezembro, 2009

Preliminar.

Através da prática docente, percebi uma imensa dificuldade em se encontrar informações que permitam manter-se em contato com acontecimentos e fenômenos próprios do conhecimento geográfico. Nesse sentido, busco compilar informações que pertençam a Disciplina de Geografia, em suas mais diversas variantes. As frentes básicas trabalhadas em Geografia no ensino formal - Geral, Brasil e Geopolítica - desmembram-se em inúmeras vertentes e temas, dando margem a uma infinidade de assuntos.
Para isso, venho pesquisando diversas fontes voltadas a Geografia, especificamente ou com certo grau de proximidade, mas que facilitem o entendimento do seu conteúdo, assim como o seu aprofundamento. Mapas, gráficos, infográficos, textos, resumos, apresentações, vídeos, sites, entre outras fontes, serão acumuladas neste espaço virtual, visando chegar até aqueles que dela mais precisam, alunos dispostos a se aproximar da riqueza presente na Geografia.
Não tenho a intensão de discutir os fundamentos teóricos e metodológicos da Geografia, para isso, acadêmicos são muito bem pagos. Quero sim, disponibilizar informações práticas que auxiliem o dia a dia de alunos do Ensino Fundamental, Médio e Pré-Vestibulares.
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