16 fevereiro, 2010

Desenvolvimento - Outro conceito é possível

Desenvolvimento: Outro conceito é possível


Uma mudança no conceito de desenvolvimento daria aos países pobres a oportunidade de crescerem e superarem os desafios da mudança climática e das crises alimentar e financeira mundiais, afirmou a Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad).
A questão crucial é evitar medidas de resposta para crises que perpetuem padrões de produção e de consumo insustentáveis do ponto de vista econômico, social e ambiental, alerta um estudo da Unctad.
O relatório “Comércio e Meio Ambiente 2009/2010” afirma que o crescimento e o comércio têm sido determinados pelos efeitos da economia de escala, baseada no preceito que vincula a redução do custo de produção ao aumento do número de unidades produzidas. A tarefa principal para as próximas décadas será modificar o conceito de desenvolvimento de maneira que o primordial seja levar em conta o efeito das mudanças estruturais e tecnológicas, disse Ulrich Hoffmann, chefe da seção de Comércio e Desenvolvimento Sustentável da Unctad.
O que falta não é uma mudança gradual, mas uma espécie de “esforço de tempos de guerra”, disse Hoffmann à IPS. Os governos terão que agir como se estivessem em condições de um conflito bélico, explicou. Deve ser algo completamente diferente do que vimos nos últimos 20 ou 30 anos, insistiu. O que se exige dos governos são políticas industriais ativas, o abandono dessa espécie de passividade neoliberal e o retorno a políticas industrialistas, acrescentou.
O desafio é colossal, admite o informe distribuído ontem. Entre 1980 e 2008, quase 30 anos, a intensidade do carbono exigido pelo crescimento diminuiu, de cerca de um quilo para cada dólar de produto interno bruto para 770 gramas, ou seja, em torno de 23%. Porém, para alcançar em 2050 as metas de redução de emissões de gases-estufa, causadores da mudança climática, a intensidade do carbono deverá baixar até seis gramas por dólar do PIB, isto é, cerca de 130 vezes abaixo do nível atual. Um desafio dessa magnitude exige mudanças drásticas no conceito de desenvolvimento, afirmou o especialista.
Os esforços de mitigação do aquecimento global devem ser vistos como parte de um processo de mudança estrutural e de inovação, combinado com justiça social. Falamos de um modelo de crescimento e desenvolvimento estrutural e qualitativamente diferente, explicou. O estudo da Unctad incursiona nas causas da crise que afeta os sistemas econômico e financeiro, o clima e o acesso aos alimentos. Uma das razões é o rápido aumento das desigualdades na renda, especialmente nos membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE), que agrupa países ricos, e algumas nações em desenvolvimento.
Nos Estados Unidos, no final de 2007, o salário real médio de trabalhadores homens em regime integral era inferior ao que recebiam no começo da década de 70. Na maior parte dos países da OCDE, nas duas últimas décadas, a maioria dos ganhos acabou na porção mais rica da população. Outra causa notável foi o aumento dos preços dos produtos básicos industriais, que em termos reais alcançaram níveis sem precedentes em meados de 2008. A alta incluiu os preços de minerais e metais, e também de combustíveis, mas não dos alimentos, disse a Unctad.
A terceira origem da crise foi o “cassino financeiro”. A falta de regulamentações internacionais fez com que, em muitos países ricos, apenas 10% dos benefícios obtidos pelas empresas dedicadas à produção fossem investidos em atividades do mesmo tipo. O resto do lucro acabou nos mercados financeiros, em busca de benefícios especulativos.
O estudo cita um dado do Banco de Pagamentos Internacionais, que coordena bancos centrais, que indica um total de US$ 600 trilhões para o capital especulativo investido no final de 2007. Essa quantia equivale a 10 ou 11 vezes o valor do PIB mundial, que em 2007 foi estimado entre US$ 55 trilhões e US$ 65 trilhões, disse a Unctad. Neste ponto, o estudo propõe que os países em desenvolvimento avancem no processo para economias verdes, mediante a criação de “polos de crescimento limpo”. Uma primeira alternativa seria melhorar a eficiência energética.
A Unctad afirma que, desta forma, seria possível cobrir dois terços dos objetivos de redução global de emissões de gases-estufa estabelecidos para 2030. Na área de eficiência energética, o setor da construção se destaca como muito promissor. A criação de edifícios verdes envolveria empresas pequenas e médias, usando materiais locais e estimulando o comércio Sul-Sul, além de favorecer o emprego local, disse Hoffmann.
Outro polo de crescimento limpo proposto pela Unctad é a promoção da agricultura sustentável, que, no caso particular da orgânica, tem uma eficiência energética entre 25% e 60% acima da convencional. A agricultura orgânica obtém melhores preços, ocupa mais força de trabalho e não usa agroquímicos. Este fator ganha importância ao se pensar que um continente como a África importa cerca de 90% dos fertilizantes e pesticidas que utiliza, destaca Hoffmann. Se levarmos a sério a agricultura, que é um dos setores vitais para a maioria dos países em desenvolvimento, e a combinarmos com as energias renováveis nas áreas rurais, isso se converte em uma passagem de primeira classe para o desenvolvimento, ressaltou.
Este especialista da Unctad disse que a reforma do sistema financeiro internacional é uma condição necessária para avançar nos planos de crescimento limpo nos países pobres. Também destacou a necessidade de desestimular a especulação financeira mediante diversas estratégias e incentivar os investimentos “verdes”. IPS/Envolverde

Fonte: mwglobal.org/ipsbrasil.net
Autor: Gustavo Capdevila - 9/Fevereiro/2010

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